Os afegãos vão eleger no sábado um novo presidente, após 13 anos de poder de Hamid Karzai e de uma intervenção militar, liderada pelos Estados Unidos, que transformaram profundamente o país sem conseguirem integrar os talibãs.
Esta primeira passagem de testemunho, de um presidente democraticamente eleito para outro, é considerada um teste maior à estabilidade do país e à solidez das instituições afegãs. Ao mesmo tempo, a retirada das forças da NATO, até ao final deste ano, faz recear uma nova onda de violência.A forma como vai decorrer o escrutínio será também reveladora dos progressos alcançados no Afeganistão desde o fim do regime dos talibãs, afastados do poder em 2001, na sequência dos atentados terroristas de 11 de setembro, por uma coligação militar internacional liderada pelos Estados Unidos.
Os talibãs continuam a ser a força motriz de uma violenta rebelião. Mais de três mil civis morreram no conflito no ano passado, mais 7% que em 2012, de acordo com dados da ONU.
Nos últimos 13 anos, os ocidentais destacaram meios militares excecionais e investiram milhares de milhões de dólares para fazer sair o Afeganistão do marasmo económico e cultural em que foi deixado pelos talibãs.
Os direitos das mulheres conheceram uma evolução, as cidades desenvolveram-se, uma sociedade jovem e dinâmica faz avançar um país onde as zonas rurais continuam empobrecidas, a corrupção é endémica e a cultura do ópio prospera.
Nestes 13 anos, o Afeganistão só conheceu um dirigente: Hamid Karzai.
Instalado no poder no final de 2001 pelos ocidentais, foi eleito uma primeira vez em 2004 e reeleito em 2009, num escrutínio caótico e marcado por uma fraca participação (cerca de 30%), fraudes maciças e violência.
Após dois mandatos, este líder hábil, colérico e carismático é obrigado a retirar-se, dado que a Constituição afegã não permite a candidatura a um terceiro mandato.
No sábado, na primeira volta das presidenciais, os eleitores podem escolher entre oito candidatos, dos quais se destacam três favoritos, todos antigos ministros de Karzai: Zalmai Rassul, considerado como o candidato do poder cessante; Ashraf Ghani, economista de renome, e Abdullah Abdullah, opositor que ficou em segundo lugar nas presidenciais de 2009.
Mais do que a escolha de um nome, este escrutínio enfrenta várias incógnitas, a começar pela violência dos rebeldes talibãs, que prometeram perturbar a eleição, incluindo com ataques às assembleias de voto.
A 20 de março, os rebeldes mataram dez polícias em Jalalabad (leste) e nove civis, incluindo quatro estrangeiros, num ataque a um hotel de Cabul. Na quarta-feira, último dia da campanha, mataram mais seis polícias num ataque contra o ministério do Interior.
Esta violência poderá ter um impacto direto na participação dos eleitores, além de prejudicar a credibilidade do escrutínio, considerou Abdul Waheed Wafa, perito da universidade de Cabul.
«Se nas cidades, as pessoas estão determinadas em votar, a situação é diferente nas zonas rurais do sul e do leste, onde os talibãs são poderosos e onde a participação poderá ser fraca», sublinhou.
Para este escrutínio de alto risco, as autoridades estabeleceram um dispositivo excecional de segurança para proteger cerca de seis mil assembleias de voto.
Outras incógnitas são a fraude e a influência que podem ter no resultado eleitoral atores internos - chefes locais, ou o poder cessante -, e atores externos, com interesses estratégicos no país, como os Estados Unidos, Irão ou Paquistão.
Os primeiros resultados da primeira volta só vão ser conhecidos depois de 24 de abril. A segunda volta, a realizar-se, está marcada para 28 de maio.
«A legitimidade das eleições está nas mãos dos derrotados», afirmou Graeme Smith, perito do International Crisis Group (ICG), em Cabul. «A sua reação vai determinar o impacto desta eleição na estabilidade do país».
Diário Digital com Lusa
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