Mortes no Burundi reacendem receios de nova violência étnica
Confrontos começaram após golpe falhado de maio e têm seguido linhas políticas, mas tensão entre hutus e tutsis está latente
Na
maioria jovens, baleados e alguns com as mãos atadas atrás das costas.
Foi assim que os habitantes de Bujumbura encontraram ontem de manhã
dezenas de corpos nas ruas da capital do Burundi. Segundo o exército, a
violência de sexta-feira - a pior desde uma tentativa falhada de golpe
de Estado em maio - fez pelo menos 90 mortos e, se até agora os
confrontos se têm regido por linhas políticas, a comunidade
internacional receia que possa reabrir as velhas divisões étnicas entre a
maioria hutu e a minoria tutsi.
O
porta-voz do exército do Burundi, Gaspard Baratuza, explicou à Reuters
que depois de grupos de jovens terem atacado três posições militares na
capital, envolvendo-se em confrontos com soldados, o balanço da
violência de sexta-feira foi de 79 atacantes mortos e 45 feridos. Do
lado das forças de segurança, morreram quatro militares e quatro agentes
da polícias. Um relato que contrasta com o de várias testemunhas que
garantem que a polícia realizou buscas casa a casa, tendo depois matado
os seus ocupantes.
Ontem as ruas de
Bujumbura estavam calmas, depois de o exército ter confiscado armas e
munições. A violência no Burundi começou em abril, depois de o
presidente Pierre Nkurunziza anunciar a intenção de se candidatar a um
terceiro mandato. Autorizado a tal em maio pelo Tribunal Constitucional -
cujos juízes terão sido intimidados, garante a oposição -, Nkurunziza
escapou a uma tentativa de golpe e acabou por vencer as eleições de
julho.
Segundo as Nações Unidas, já
foram mortos pelo menos 240 pessoas desde abril e mais de 200 mil
fugiram para os países vizinhos. A violência dos últimos meses faz temer
um regresso da tensão étnica entre hutus e tutsis num dos países mais
pobres do mundo (mas que há duas décadas conseguiu evitar o genocídio do
vizinho Ruanda).
O Burundi saiu em
2005 de 12 anos de guerra civil durante a qual grupos rebeldes hutus,
entre eles um liderado pelo agora presidente Nkurunziza, lutaram contra o
exército dominado pelos tutsis. O conflito estalou em 1993 com a morte
do chefe do Estado Melchior Ndadaye, da maioria hutu.
Sanções
Para
a próxima quinta-feira está prevista uma sessão especial do Conselho
dos Direitos Humanos da ONU para discutir a situação no Burundi. A
reunião foi pedida pelos EUA e apoiada por 18 dos membros do Conselho,
mais do que o mínimo de um terço necessário. Mas apenas um país africano
apoiou o pedido: o Gana.
Na sequência
do golpe falhado de maio, EUA e União Europeia impuseram sanções contra
quatro cidadãos do Burundi, incluindo dois antigos militares envolvidos
na tentativa de derrube do presidente. "Ficamos felizes com as sanções,
mas já vêm um pouco tarde, depois de todas as mortes que já houve no
Burundi", afirmou à BBC Pierre Claver Mbonimpa, um ativista dos direitos
humanos que se encontra a receber tratamento médico em Bruxelas depois
de em agosto ter ficado gravemente ferido ao ser atingido por uma bala
nas cordas vocais e outra na coluna.
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