Globo recria filme de Tim Maia para "limpar imagem" de Roberto Carlos.
A tradição da TV Globo de transformar filmes em minissérie fez mais que isso com a exibição de “Tim Maia” entre
quinta (1/1) e sexta (2/1). A produção mudou a narração e intercalou
depoimentos entre as cenas, dando ao longa a aparência de um capítulo do
programa “Por Toda a Minha Vida”. Mas o impacto foi ainda maior
que a simples banalização da obra. A inclusão de entrevistas não se
justificou pelo aumento da duração da trama, uma vez que várias cenas
foram cortadas para acomodá-las. Na verdade, a “recriação” do filme dirigido por Mauro Lima (“Meu Nome Não É Johnny”) parece ter sido realizada com o objetivo de transformar o vilão do longa em herói da minissérie. Ninguém menos que Roberto Carlos.
A versão da Globo omitiu várias sequências vistas no cinema, em
especial a forma como Roberto, já famoso, esnobava Tim, que ainda estava
no início de carreira. Ao contrário do filme, a minissérie apresenta Roberto Carlos como o responsável pela carreira de Tim Maia. Os dois cantores conviveram desde os anos 1950, quando participavam da mesma banda, Os Sputiniks, que se desfez quando Roberto decidiu seguir carreira solo. Nesse ínterim, Tim Maia se mudou para os Estados Unidos, foi preso e deportado para o Brasil. Em busca de ajuda para recomeçar, procurou Roberto Carlos, que, já famoso, comandava o programa Jovem Guarda na Record, e foi esnobado.
Uma sequência do filme que mostrava claramente a humilhação trazia
Roberto dando a Tim botas usadas e dinheiro amassado. Na minissérie, não
só a sequência está ausente como há depoimentos de Nelson Motta, autor da biografia que originou o longa, e do próprio Roberto Carlos,
que exaltam a amizade entre os dois. Motta chega a contradizer seu
próprio livro ao afirmar que Roberto fez o que podia para ajudar Tim. Já
Roberto conta que indicou o cantor a uma gravadora. A minissérie chegou
a criar uma cena especialmente para referendar sua versão da história,
mostrando Babu Santana, intérprete de Tim Maia, dando créditos a Roberto. “E foi assim, rapaziada, que o Roberto Carlos lançou o gordo mais querido do Brasil”, ele diz, num apêndice que não pertencia ao filme original.
A responsabilidade por tantas mudanças não foi da produção do filme, mas
consequência do contrato com a Globo, que se considerou no direito de
fazer o que quis com o trabalho cinematográfico, a ponto de utilizar
outro diretor (Luis Felipe Sá, do humorístico “Junto & Misturado”) e uma roteirista (Patricia Andrade, de “Gonzaga: De Pai pra Filho”) para levar a cabo o que batizou de “recriação de um filme”. A exibição televisiva ganhou até subtítulo, virando, ironicamente, “Tim Maia, Vale o Que Vier”. Pena
que o vale tudo da TV tenha destruído a coisa mais bonita, um filme que
tinha obtido elogios da crítica, transformado numa minissérie
controversa e de qualidade duvidosa. “Ah! Se o mundo inteiro me pudesse ouvir/ Tenho muito pra contar…”
Com isso, muitos que leram o livro Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia (2007) ou assistiram ao filme Tim Maia (2014) nos cinemas, que é inspirado na biografia escrita por Nelson Motta,
não gostaram da versão global, exibida em dois capítulos. Essa mudança
parece ter desagradado não somente o público, mas também o diretor de Tim Maia, Mauro Lima.
No Instagram, o cineasta ironizou a exibição e pediu aos que ainda não
viram o filme, que não assistam ao material feito pela emissora. "Aos
seguidores que não viram Tim Maia no cinema sugiro que não assistam
essa versão que vai ao ar hoje e amanhã na Globo. Trata-se de um
subproduto que não escrevi daquele modo, nem dirigi ou editei", recomendou.
Com informações dos sites: Pipoca Moderna e Terra
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