quinta-feira, 17 de março de 2016

Conversa entre Dilma e Lula foi grampeada após despacho de Moro

Conversa entre Dilma e Lula foi grampeada após despacho de Moro

Fim da interceptação foi decretado às 11h12. Conversa ocorreu às 13h32.
Juiz diz 'não ver maiores problemas' e mantém gravação no processo

Samuel Nunes*Do G1 PR
A conversa entre a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a respeito do termo de posse dele como ministro-chefe da Casa Civil foi feita quase duas horas depois de o juiz federal Sérgio Moro mandar a Polícia Federal suspender as interceptações telefônicas de Lula.
Segundo um documento da própria Polícia Federal, o diálogo entre Dilma e Lula foi interceptado às 13h32, desta quarta-feira (16). No entanto, o juiz Sérgio Moro havia determinado às 11h20 o fim das interceptações dos terminais telefônicos ligados ao ex-presidente.
Na manhã desta quinta-feira (17), o juiz Sérgio Moro disse que não havia reparado antes no ponto, mas que não viu maior relevância. "Como havia justa causa e autorização legal para a interceptação, não vislumbro maiores problemas no ocorrido", argumento o juiz.
Sérgio Moro argumentou ainda que "não é ainda o caso de exclusão do diálogo considerando o seu conteúdo relevante no contexto das investigações". Veja o texto publicado pelo juiz, na íntegra, no final da reportagem.

Nesta tarde, o Ministério Público Federal (MPF) divulgou uma nota argumentando que as interceptações telefônicas foram legais. Os procuradores da força-tarefa da Lava Jato afirmam que tentativas de amedrontar policiais federais, auditores da Receita Federal, procuradores devem ser repudiadas. A nota ainda afirma que as conversas telefônicas constituem evidências de obstrução à investigação. Veja a nota na íntegra no fim da reportagem.
Entenda
Uma hora depois da determinação do fim das interceptações, Moro enviou às operadoras telefônicas que mantinham os números ofícios para que elas suspendessem as gravações.

No caso específico do terminal que teve a conversa grampeada, o documento encaminhado à operadora Claro foi assinado pelo juiz Sérgio Moro às 12h17 e publicado no sistema da Justiça Federal três minutos depois.
Às 15h37, o áudio e a transcrição da conversa de Lula e Dilma foram anexados no sistema da Justiça Federal. Às 16h21, Moro publicou a decisão que retirava o sigilo sobre as interceptações telefônicas do ex-presidente.
PF diz que interceptação é feita pelas próprias empresas de telefonia
Em nota, a Polícia Federal afirmou que a interceptação das ligações é feita pelas próprias empresas de telefonia móvel. A polícia disse que informou a Claro assim que recebeu a ordem do juiz. No entanto, afirma que até o cumprimento da decisão houve a interceptação de algumas ligações.
"Encerrado efetivamente o sinal pela companhia, foi elaborado o respectivo relatório e encaminhado ao juízo competente, a quem cabe decidir sobre a sua utilização no processo", diz trecho da nota da PF.

O que dizem os advogados especialistas
O G1 consultou advogados sobre o assunto. Para a presidente da Comissão de Estudos de Compliance em Matéria Criminal do Instituto dos Advogados de São Paulo, Carla Rahal Benedetti, a gravação vai ser questionada e não é possível saber qual será a decisão do STF sobre o assunto.
“Uns vão entender como prova ilícita e outros vão entender que não”, afirma. “Eu questionaria certamente, como advogada de defesa. E pode até ser que os ministros do STF anulem.”
Para o presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, a gravação do diálogo entre Lula e Dilma não pode ser usado como prova na Justiça.
“Ou bem havia autorização judicial, ou bem não havia. Se não havia, a gravação não pode ter sido feita e ele [juiz] não pode validar a gravação sem ter autorização judicial”, afirma Costa. “A partir do momento em que foi determinado que não se procedesse (mais à gravação), aquilo que surgir depois dela, não pode ser aproveitado.”
Costa também argumenta que, ao receber a gravação com os diálogos da presidente, Moro deveria encaminhar o caso para o Supremo Tribunal Federal, uma vez que Dilma tem foro privilegiado.
O advogado e professor de direito penal Jeffrey Chiquini também analisou o andamento processual do inquérito contendo as gravações telefônicas do ex-presidente. "A partir do momento em que o delegado é intimado, todas as gravações que viessem a ser feitas depois não poderiam mais ser usadas, nem sequer transcritas pela polícia federal", afirma. Para ele, há ilegalidade tanto do lado da polícia, quanto do juiz ao divulgar tal gravação.
Roberto Delmanto Júnior, conselheiro da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) próximo ao movimento Vem Pra Rua, avalia que, como a decisão de Moro não estabelece horário para a interrupção do grampo, a gravação do diálogo entre Lula e Dilma é legal.
“Se não tem horário definido, a gravação continua válida até a operadora encerrar."
 
 Conversa com Dilma
- Dilma: Alô
- Lula: Alô
- Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
- Lula: Fala, querida. Ahn
- Dilma: Seguinte, eu tô mandando o 'Bessias' junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
- Lula:  Uhum. Tá bom, tá bom.
- Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
- Lula: Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.
- Dilma: Tá?!
- Lula: Tá bom.
- Dilma: Tchau.
- Lula: Tchau, querida.
O Advogado Geral da União, José Eduardo Cardozo, disse que o diálogo de Dilma, ao contrário da interpretação da oposição, não estava dando a Lula um documento para ele se livrar de possível ação policial.
Segundo Cardozo, a presidente estava enviando a Lula o documento chamado termo de posse, para ele assinar. Isso porque Lula, de acordo com Cardozo, estava com problemas para comparecer à cerimônia de posse marcada para quinta-feira (17).
O Planalto emitiu nota em que afirma que vê 'afronta' a direito de Dilma na divulgação do telefonema. Leia na íntegra.
Grampo em escritório de advocacia
O escritório Teixeira, Martins & Advogados, que atende Luiz Inácio Lula da Silva, afirma que a operação Lava-Jato fez grampo ilegal de Roberto Teixeira, que representa o ex-presidente, e de 25 advogados que trabalham na empresa.
Em nota, Teixeira e seu sócio Cristiano Zanin Martins dizem ter tomado conhecimento na quarta-feira (16) de que o juiz federal Sérgio Moro autorizou a interceptação do telefone celular de Teixeira. Além disso, o telefone central do escritório foi grampeado, afirma a nota, dando acesso aos telefonemas de outros advogados que representam Lula. Leia a nota na íntegra.
Veja a texto publicado pelo juiz na íntegra:
Determinei a interrupção da interceptação, por despacho de 16/03/2016, às 11:12:22 (evento 112).
Entre a decisão e a implementação da ordem junto às operadoras, colhido novo diálogo telefônico, às 13:32, juntado pela autoridade policial no evento 133.
Não havia reparado antes no ponto, mas não vejo maior relevância.


Como havia justa causa e autorização legal para a interceptação, não vislumbro maiores problemas no ocorrido, valendo, portanto, o já consignado na decisão do evento 135.
Não é ainda o caso de exclusão do diálogo considerando o seu conteúdo relevante no contexto das investigações, conforme já explicitado na decisão do evento 135 e na manifestação do MPF do evento 132.

A circunstância do diálogo ter por interlocutor autoridade com foro privilegiado não altera o quadro, pois o interceptado era o investigado e não a autoridade, sendo a comunicação interceptada fortuitamente. Ademais, nem mesmo o supremo mandatário da República tem um privilégio absoluto no resguardo de suas comunicações, aqui colhidas apenas fortuitamente, podendo ser citado o conhecido precedente da Suprema Corte norte-americana em US v. Nixon, 1974, ainda um exemplo a ser seguido.

Evidentemente, caberá ao Supremo Tribunal Federal, quando receber o processo,  decidir definitivamente sobre essas questões.

Então apenas prossiga a Secretaria no cumprimento do despacho do evento 135. Sobrevindo informação sobre a efetiva posse do investigado no cargo de Ministro Chefe da Casa Civil, remetam-se os autos, com os conexos, ao Supremo Tribunal Federal.

Veja a nota do MPF
Os Procuradores da República do caso Lava Jato em Curitiba têm o dever de esclarecer que as interceptações telefônicas foram legalmente determinadas pelo Juízo da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba.

As tentativas de amedrontar policiais federais, auditores da Receita Federal, procuradores da República e o juiz federal Sérgio Moro devem ser repudiadas. Os atentados à investigação revelam a extensão do abuso de poder e do descaso com o Estado Democrático de Direito na República.
As conversas telefônicas constituem evidências de obstrução à investigação, em uma guerra subterrânea e desleal travada nas sombras, longe dos tribunais. O Estado Democrático não existe sem o Direito. Não há Direito sem um Poder Judiciário independente. Não há independência do Poder Judiciário se não forem respeitadas as suas decisões.
A força das investigações na Lava Jato deriva da busca da verdade e da Justiça, com base em princípios e regras compartilhados com a sociedade e estabelecidos na Constituição. O Ministério Público Brasileiro e a Justiça não se amedrontarão e darão fiel cumprimento à lei.
Todos os atos processuais da investigação Lava Jato são submetidos a diversas instâncias do Poder Judiciário, conforme o devido processo legal, e é essa a forma própria de discussão das investigações e das decisões.
Ressaltamos que as decisões judiciais foram proferidas a pedido do Ministério Público Federal, por seus procuradores da República, os quais assumem publicamente a sua responsabilidade pela condução das investigações.
Por fim, reafirmamos nossa confiança nas instituições democráticas, no funcionamento do Poder Judiciário, no princípio Republicano e, sobretudo, no primado de que todos são iguais perante a Lei.
Procuradores da República da força-tarefa do caso Lava Jato:
Antonio Carlos Welter
Athayde Ribeiro Costa
Carlos Fernando dos Santos Lima
Deltan Martinazzo Dallagnol
Diogo Castor de Mattos
Isabel Cristina Groba Vieira
Januário Paludo
Jerusa Burmann Viecili
Julio Carlos Motta Noronha
Laura Gonçalves Tessler
Orlando Martello Junior
Paulo Roberto Galvão de Carvalho
Roberson Henrique Pozzobon



*Colaborou: Vitor Sorano, do G1 SP.

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