quinta-feira, 30 de junho de 2011

Chávez, o eterno, está doente

Já lá se foram três semanas desde que o chanceler venezuelano Nicolás Maduro informou o mundo de que o presidente Hugo Chávez Frías fora submetido a uma intervenção cirúrgica em Havana, acrescentando: “pero volverá en breves dias”. O que era para ser algo passageiro começou a prolongar-se e o assunto caiu num mar de suposições alimentado pelo mutismo total das autoridades e dos médicos, transformando o problema num segredo de estado. O próprio Maduro se encarregou de acender a máquina de boatos ao declarar: “a batalha que está dando o presidente Chávez é a batalha pela vida”. Sua mãe rogou aos céus: “que Deus o cure!”. Nada de concreto se sabe, mas a hipótese diagnóstica mais veiculada é de um abscesso pélvico devido a um câncer de próstata, inflamação intestinal ou diverticulite que se complicou. O jornal argentino Clarín informou que há quem culpe um oficial da inteligência cubana por tê-lo baleado após uma discussão por mulheres. As imagens agora divulgadas mostram a Chávez como um convalescente ao lado de Fidel e a mais recente previsão oficial é de que estará em Caracas dia 5 de julho para a abertura da Cúpula de Estados Latino-Americanos e Caribenhos e festividades pelo segundo centenário da independência nacional.
É mais do que o suficiente para convulsionar, e de maneira cada vez mais forte, tanto a oposição quanto a situação na Venezuela e mesmo fora dela, nas rodas de café e rum de Miami. Segundo José Albornoz, Secretário-Geral do movimento Pátria para Todos, “soltaram-se os demônios”. O atual governador do estado de Barinas, Adán Chávez (irmão do presidente), tomou do microfone no último fim de semana e sem explicar as razões de seu nervosismo conclamou os companheiros do PSUV – Partido Socialista Unido da Venezuela – a não se limitarem à via eleitoral, apelando para a luta armada a fim de manter o poder. Na verdade, o partido criado por Chávez com o objetivo de ser o único situacionista no país é um amálgama de quase infinitas opiniões e posições políticas, não havendo uma só liderança de destaque no grupo que hoje administra a Venezuela. São todos Chávez-dependentes e a hipótese de substituí-lo, caso retorne sem condições de saúde para governar, só agora começa a ser aventada. O mantra repetido à exaustão pelo PSUV é de que “con Chávez todo, sin Chávez nada”. O sociólogo e ex-professor universitário de 42 anos Elías Jaua, que está respondendo pela administração federal, foi nomeado vice-presidente em janeiro de 2010 e nunca teve qualquer papel efetivo nas tomadas de decisão de interesse para o país.  
Outra hipótese, com menor credibilidade geral, é de que tudo não passaria de uma jogada do governo, visando mostrar seu líder como um super-homem que a tudo vence, inclusive a morte, algo muito conveniente diante do fantasma das eleições presidenciais de dezembro de 2012. O fato é que em quase treze anos de poder absoluto Chávez nunca tirou férias nem teve qualquer doença séria. Este ano por duas vezes seu programa das 2as. feiras foi adiado, um devido a gripe e o outro por uma cirurgia no joelho, problemas que não o impediram de estar novamente na ativa na semana seguinte.
A oposição parece mais atarantada do que nunca e, receosa de ser acusada de estar tirando proveito de uma doença, limita-se a pedir esclarecimentos médicos. Dificilmente alcançará a união nas prévias que estão previstas para fevereiro do próximo ano, quando uma votação popular deverá escolher o candidato único e o nome do movimento político que o respaldará em nome de todos os partidos contrários a Chávez. Para não ser ligado ao passado, possivelmente o indicado será um jovem, existindo três postulantes principais: Henrique Capriles de 39 anos, governador do estado de Miranda; Pablo Pérez (42 anos), governador de Zulia e o prefeito de Chacao – uma municipalidade junto a Caracas -, Leopoldo López (40 anos), este considerado inelegível pela justiça chavista até 2014. O candidato derrotado nas eleições anteriores, Manuel Rosales, diz que voltará ao país deixando o exílio no Peru, para onde teve de fugir ao ter um mandato de prisão decretado. A Corte Inter-Americana de Direitos Humanos tem um caso contra Chávez por desqualificação sistemática dos adversários políticos por razões administrativas inconsistentes. Fala-se, ainda, na deputada Maria Corina Machado pelo destaque obtido na Assembléia unicameral venezuelana, apontada por Chávez que a chama de “a burguesinha” como sua candidata de oposição preferida.  Com uma ligeira vantagem nas preferências populares, Capriles é tido como uma figura ascendente por sua carreira meteórica e sempre como o mais jovem a ocupar cargos, desde quando foi prefeito da cidade de Baruta. Passou meses preso por acusações oficiais de ligação com o golpe de 2002 e ao ser solto viu seu prestígio aumentar sempre. Na última pesquisa nacional de opinião independente superou a todos os demais pré-candidatos. É o chefe do partido Primeiro Justiça e se diz convencido de que é possível uma transição sem problemas.
A grande novidade na Venezuela nestas três semanas tem sido as 2as. Feiras sem as 4 ou 5 horas de discursos de Chávez, que de imediato serviam de combustível para as análises, desmentidos e respostas da oposição. Há o perigo de que o povo se acostume a este inesperado silêncio, desligando as TVs e os rádios caso o programa Alô Presidente retorne.         
Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional

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