Assustada, população de cidade do Piauí tenta entender estupro de adolescentes
Um crime bárbaro cometido no fim de
maio deixou perplexos não só os mais de 19 mil habitantes da pequena
Castelo do Piauí, a cerca de 190 quilômetros de Teresina, como reacendeu
o alerta para o aumento da criminalidade em municípios do interior do
país, até pouco tempo considerados pacatos.
A população está assustada com a crueldade com que os cinco suspeitos – um homem de 40 anos e quatro adolescentes moradores da própria cidade – trataram as vítimas, quatro garotas que foram amarradas, agredidas e estupradas e depois jogadas do alto de um penhasco. Devido aos ferimentos, uma das vítimas, de 17 anos, morreu no último dia 7. Ela teve a face esmagada, lesões no pescoço e no tórax. Duas das meninas tiveram alta hospitalar e uma continua internada.
Ontem (11), os quatro rapazes foram ouvidos pela Justiça, em Teresina, durante todo o dia.
“O problema maior da violência no país é a droga”, disse à Agência Brasil o prefeito de Castelo, José Ismar Lima Martins. Segundo ele, o adulto e os adolescentes já autuados pela polícia estavam sob efeito de drogas quando encontraram as jovens em um local afastado, de onde é possível avistar toda a cidade, o Morro do Garrote, onde as meninas tinham ido tirar fotografias. Ainda segundo o prefeito, enquanto o adulto, apontado como “cabeça” do crime, já esteve preso em São Paulo, os rapazes eram conhecidos das autoridades locais por cometerem pequenos furtos.
“A desestruturação familiar é um outro problema. Infelizmente, em parte devido a problemas familiares, os quatro jovens suspeitos abandonaram os estudos e acabaram nas drogas”, disse o prefeito antes de lamentar que, também devido a esses problemas, as mães se veem obrigadas a transferir para o Estado toda a responsabilidade com as crianças, inclusive a educação pessoal.
O prefeito diz que é defensor da redução da maioridade penal apenas para casos de crimes bárbaros. “O Estado não tem condições de abrigar em cadeias todo jovem que cometer uma infração. E apenas jogar os adolescentes numa cela, sem estrutura adequada para a ressocialização, só vai piorar a situação.”
Em Castelo do Piauí, as principais atividades econômicas são a agricultura familiar e a prestação de serviços. Castigado pela seca que afeta o sertão nordestino, Castelo está entre os municípios piauienses que, desde o primeiro semestre de 2014, estão em estado de calamidade.
Em 2010, das 5.565 cidades brasileiras, Castelo do Piauí ocupou a posição número 4.467 do ranking Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (IDHM), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O mau desempenho decorreu, principalmente, do baixo índice de escolaridade (0,47). No primeiro lugar do ranking, a cidade de São Caetano do Sul, em São Paulo, obteve 0,81.
No mesmo ano, apenas três (29,6%) de cada dez jovens com 18 anos ou mais tinham completado o ensino fundamental. O resultado é duas vezes melhor que o de 15 anos antes, quando apenas 12% dos jovens desta faixa etária se formavam – perspectiva com a qual cresceram os quatro adolescentes acusados pelo crime, cujas idades variam entre 15 e 17 anos.
A cidade conta apenas com uma delegacia e três policiais. O delegado dá expediente em um município vizinho, Campo Maior, de onde responde por várias outras localidades da região. Tal situação, segundo o prefeito, é incompatível mesmo com as necessidades de uma cidade que nunca tinha visto algo tão violento.
“A falta de policiais nas delegacias é um problema de quase toda cidade pequena do interior”, afirmou o prefeito, que, até ontem (11) à noite, estudava cancelar a décima primeira edição do evento mais importante da cidade, o Cachaça Fest, e investir os cerca de R$ 600 mil previstos para gastos em ações de segurança e de combate às drogas. Depois de se reunir com secretários municipais, vereadores e representantes da sociedade civil, o prefeito manteve o evento.
Nascido no município e conselheiro tutelar há quatro anos, Francisco Alberto Cardoso de Sousa sustenta que a tragédia de Castelo não começou com o suplício das quatro adolescentes, mas sim quando o Estado e a sociedade perderam os rapazes para o crime e as drogas.
“Eles vêm de famílias desestruturadas que não tinham pulso firme, são filhos de pais alcoólatras, usavam drogas e já tinham sido atendidos algumas vezes pelos conselheiros. Por denúncias de furtos e por vandalismo na escola. Tomamos todas as providências cabíveis. Mas, infelizmente, faltam políticas públicas adequadas. Não conseguimos ressocializar os jovens que erram. Não lhes damos novas oportunidades. Eles passam a ser cada vez mais malvistos por todos e acabam excluídos. Nem as escolas os aceitavam mais”, destacou o conselheiro, classificando os quatro suspeitos de “frios” e o crime, de “bárbaro”.
Dois dias antes do crime, o Conselho Tutelar pediu que dois dos quatro suspeitos fossem apreendidos por outros atos infracionais. Infelizmente, os rapazes e as meninas se encontraram antes que a Justiça autorizasse a internação. Sousa diz que é favorável à redução da maioridade penal, qualquer que seja o ato infracional, mas acredita que, sem outras políticas públicas, a medida servirá apenas para “lotar os presídios”. “Aqui mesmo, em Castelo, a tendência é piorar enquanto não conseguirmos ocupar os jovens, colocando-os para estudar e para aprender um trabalho.”
Também natural de Castelo, o estudante Luan Leite, de 19 anos, mudou para Teresina há quase cinco anos para continuar os estudos. Ele visita a terra natal com frequência e ficou perplexo diante do ocorrido. Amigo de duas das vítimas, ele se juntou a um grupo que organizou a campanha Flores Para Elas, de arrecadação de recursos para as famílias das quatro jovens. Ele cobra punições e mais segurança. “Saber de algo assim tão violento é como tomar um murro no próprio rosto. Todo mundo com quem eu converso está se perguntando como explicar o requinte de crueldade.”
Luan Leite conta que o pai de um dos jovens detidos pelo crime prestava serviços a sua família e era conhecido por beber em excesso. “Como em todas as cidades do Piauí, há muita desigualdade social em Castelo, mas a cidade sempre foi tranquila.”
Segundo Luan, todos os idealizadores da campanha são favoráveis à redução da maioridade penal para 16 anos. “Não é a solução, mas é um começo de mudança de uma situação que está insustentável. Mas outras medidas serão necessárias.”
A população está assustada com a crueldade com que os cinco suspeitos – um homem de 40 anos e quatro adolescentes moradores da própria cidade – trataram as vítimas, quatro garotas que foram amarradas, agredidas e estupradas e depois jogadas do alto de um penhasco. Devido aos ferimentos, uma das vítimas, de 17 anos, morreu no último dia 7. Ela teve a face esmagada, lesões no pescoço e no tórax. Duas das meninas tiveram alta hospitalar e uma continua internada.
Ontem (11), os quatro rapazes foram ouvidos pela Justiça, em Teresina, durante todo o dia.
“O problema maior da violência no país é a droga”, disse à Agência Brasil o prefeito de Castelo, José Ismar Lima Martins. Segundo ele, o adulto e os adolescentes já autuados pela polícia estavam sob efeito de drogas quando encontraram as jovens em um local afastado, de onde é possível avistar toda a cidade, o Morro do Garrote, onde as meninas tinham ido tirar fotografias. Ainda segundo o prefeito, enquanto o adulto, apontado como “cabeça” do crime, já esteve preso em São Paulo, os rapazes eram conhecidos das autoridades locais por cometerem pequenos furtos.
“A desestruturação familiar é um outro problema. Infelizmente, em parte devido a problemas familiares, os quatro jovens suspeitos abandonaram os estudos e acabaram nas drogas”, disse o prefeito antes de lamentar que, também devido a esses problemas, as mães se veem obrigadas a transferir para o Estado toda a responsabilidade com as crianças, inclusive a educação pessoal.
O prefeito diz que é defensor da redução da maioridade penal apenas para casos de crimes bárbaros. “O Estado não tem condições de abrigar em cadeias todo jovem que cometer uma infração. E apenas jogar os adolescentes numa cela, sem estrutura adequada para a ressocialização, só vai piorar a situação.”
Em Castelo do Piauí, as principais atividades econômicas são a agricultura familiar e a prestação de serviços. Castigado pela seca que afeta o sertão nordestino, Castelo está entre os municípios piauienses que, desde o primeiro semestre de 2014, estão em estado de calamidade.
Em 2010, das 5.565 cidades brasileiras, Castelo do Piauí ocupou a posição número 4.467 do ranking Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (IDHM), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O mau desempenho decorreu, principalmente, do baixo índice de escolaridade (0,47). No primeiro lugar do ranking, a cidade de São Caetano do Sul, em São Paulo, obteve 0,81.
No mesmo ano, apenas três (29,6%) de cada dez jovens com 18 anos ou mais tinham completado o ensino fundamental. O resultado é duas vezes melhor que o de 15 anos antes, quando apenas 12% dos jovens desta faixa etária se formavam – perspectiva com a qual cresceram os quatro adolescentes acusados pelo crime, cujas idades variam entre 15 e 17 anos.
A cidade conta apenas com uma delegacia e três policiais. O delegado dá expediente em um município vizinho, Campo Maior, de onde responde por várias outras localidades da região. Tal situação, segundo o prefeito, é incompatível mesmo com as necessidades de uma cidade que nunca tinha visto algo tão violento.
“A falta de policiais nas delegacias é um problema de quase toda cidade pequena do interior”, afirmou o prefeito, que, até ontem (11) à noite, estudava cancelar a décima primeira edição do evento mais importante da cidade, o Cachaça Fest, e investir os cerca de R$ 600 mil previstos para gastos em ações de segurança e de combate às drogas. Depois de se reunir com secretários municipais, vereadores e representantes da sociedade civil, o prefeito manteve o evento.
Nascido no município e conselheiro tutelar há quatro anos, Francisco Alberto Cardoso de Sousa sustenta que a tragédia de Castelo não começou com o suplício das quatro adolescentes, mas sim quando o Estado e a sociedade perderam os rapazes para o crime e as drogas.
“Eles vêm de famílias desestruturadas que não tinham pulso firme, são filhos de pais alcoólatras, usavam drogas e já tinham sido atendidos algumas vezes pelos conselheiros. Por denúncias de furtos e por vandalismo na escola. Tomamos todas as providências cabíveis. Mas, infelizmente, faltam políticas públicas adequadas. Não conseguimos ressocializar os jovens que erram. Não lhes damos novas oportunidades. Eles passam a ser cada vez mais malvistos por todos e acabam excluídos. Nem as escolas os aceitavam mais”, destacou o conselheiro, classificando os quatro suspeitos de “frios” e o crime, de “bárbaro”.
Dois dias antes do crime, o Conselho Tutelar pediu que dois dos quatro suspeitos fossem apreendidos por outros atos infracionais. Infelizmente, os rapazes e as meninas se encontraram antes que a Justiça autorizasse a internação. Sousa diz que é favorável à redução da maioridade penal, qualquer que seja o ato infracional, mas acredita que, sem outras políticas públicas, a medida servirá apenas para “lotar os presídios”. “Aqui mesmo, em Castelo, a tendência é piorar enquanto não conseguirmos ocupar os jovens, colocando-os para estudar e para aprender um trabalho.”
Também natural de Castelo, o estudante Luan Leite, de 19 anos, mudou para Teresina há quase cinco anos para continuar os estudos. Ele visita a terra natal com frequência e ficou perplexo diante do ocorrido. Amigo de duas das vítimas, ele se juntou a um grupo que organizou a campanha Flores Para Elas, de arrecadação de recursos para as famílias das quatro jovens. Ele cobra punições e mais segurança. “Saber de algo assim tão violento é como tomar um murro no próprio rosto. Todo mundo com quem eu converso está se perguntando como explicar o requinte de crueldade.”
Luan Leite conta que o pai de um dos jovens detidos pelo crime prestava serviços a sua família e era conhecido por beber em excesso. “Como em todas as cidades do Piauí, há muita desigualdade social em Castelo, mas a cidade sempre foi tranquila.”
Segundo Luan, todos os idealizadores da campanha são favoráveis à redução da maioridade penal para 16 anos. “Não é a solução, mas é um começo de mudança de uma situação que está insustentável. Mas outras medidas serão necessárias.”
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