segunda-feira, 30 de julho de 2012

Ministros do Supremo trabalharam no recesso para julgar mensalão


Ministros do Supremo trabalharam no recesso para julgar mensalãoApesar dos dias de folga, magistrados continuaram estudando processo. Suprema Corte começa a julgar réus do caso na próxima quinta-feira (2)

       
O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, e o relator do mensalão, Joaquim Barbosa, repassam a jornalistas, em junho, calendário de julgamento do processo Foto: Carlos Humberto/SCO/STF
Mesmo com direito a 30 dias de recesso durante julho, vários dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal usaram o tempo livre para trabalhar no processo domensalão, que começa a ser julgado na próxima quinta-feira (2). A expectativa gerada em torno do caso obrigou os magistrados a alterarem suas rotinas para mergulhar nas50.389 páginas da ação que decidirá sobre a culpa ou inocência de 38 réus suspeitos de envolvimento no suposto esquema de compra de votos parlamentares no início do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em um ano em que a mais alta Corte do país analisou pautas polêmicas, como a validade da Lei da Ficha Limpa e a legalidade do sistema de cotas, cada um dos ministros do STF traçou cronogramas próprios para conseguir esmiuçar o imenso volume de provas, relatórios e alegações produzidos ao longo de sete anos de investigações.
O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, que entregou seu relatório em dezembro de 2011, usou os dias de folga para um ajuste fino em seu voto. Depois de seis anos à frente da ação, Barbosa aproveitou o mês para se distanciar dos holofotes: se isolou nos Estados Unidos por quatro semanas para rever detalhes do caso, retornando ao Brasil só na última quarta (25).
Com um problema crônico no quadril, o magistrado tem dado uma atenção especial à saúde na derradeira etapa do mensalão. Mesmo às vésperas do julgamento, Barbosa continua frequentando sessões de fisioterapia para suportar a maratona de debates, que poderá se estender por mais de um mês, com jornadas diárias de, pelo menos, cinco horas.
Poesia
Presidente do Supremo, o ministro CarlosAyres Britto foi obrigado a conciliar no último mês a administração do tribunal, a organização do julgamento e as demandas direcionadas à Corte no recesso com a elaboração de seu voto. Com a agenda sobrecarregada, o magistrado contou com o suporte de dois assessores jurídicos e um juiz auxiliar para analisar o processo.
Em julho, após suas caminhadas matinais e exercícios de meditação, Ayres Britto tentava ficar em casa até o meio-dia concentrado no estudo do processo. Outra precaução adotada pelo chefe do Judiciário para tentar finalizar o exame do mensalão foi reduzir nas últimas três semanas os compromissos oficiais do tribunal.
Apaixonado por poesias, o ministro não abandonou os versos e estrofes nem mesmo com a pressão do julgamento que tem sido considerado o mais importante dos 183 anos de história do STF. No fim de junho, um dia após o início do recesso, Ayres Britto foi a um casamento em Brasília levando debaixo do braço um livro do advogado e poeta brasileiro Manoel de Barros. Inspirado com a cerimônia laica, realizada às margens do lago Paranoá, redigiu uma curta poesia sob a copa de uma figueira.

Rotina
Outros ministros, no entanto, se impuseram uma rotina quase espartana para avaliar o processo e elaborar os votos que serão apresentados a partir do dia 15 de agosto, na segunda fase do julgamento.
A ministra Cármen Lúcia, que desde abril acumula suas funções no STF com o comando do Tribunal Superior Eleitoral, começou a redigir seu voto, em 2011, antes mesmo de Joaquim Barbosa concluir seu relatório. Prevendo que sua gestão na Justiça Eleitoral poderia coincidir com a análise do mensalão, a magistrada mineira decidiu adiantar o trabalho.

Durante mais de um ano, Cármen Lúcia dedicou uma média de uma hora por semana para estudar o processo. Indicada para a Suprema Corte em 2006 por Lula, a juíza acorda geralmente às 5h para analisar os processos sob sua responsabilidade. Ex-aluna de um internato de Belo Horizonte, a ministra costuma repetir aos colegas de trabalho que a experiência a ensinou a ser disciplinada com o trabalho.
Segundo ministro mais novo no STF, o carioca Luiz Fux também manteve uma rotina rígida para dissecar as milhares de páginas do processo nas quatro semanas do recesso. O magistrado conta que dedicou, em julho, 10 horas diárias para preparar seu voto.
Ao lado da família, em sua casa no Rio, Fux se obrigou a acordar às 5h e redigir sua manifestação até o meio da manhã. Por volta das 10h, suspendia os trabalhos para correr e treinar jiu-jítsu. Depois do almoço, retornava à apreciação do caso, estendendo-se até o início da noite sobre os documentos.
O ministro estruturou seu voto em quatro capítulos, divididos entre os fatos relatados pela Procuradoria-Geral da República, as provas coletadas, a doutrina e a análise do esquema com base na legislação. "A grande dificuldade desse processo é que os crimes noticiados são extremamente complexos", ponderou o ministro.
Gabinete
Protagonista de um bate-boca público com o ex-presidente Lula por conta do julgamento do mensalão em maio, o ministro Gilmar Mendes se focou durante as férias nos ajustes de seu voto, iniciado tão logo Joaquim Barbosa disponibilizou seu relatório.
Apesar do recesso, o magistrado compareceu ao Supremo quase todos os dias nas últimas semanas. Segundo assessores, Mendes se sente à vontade trabalhando em seu gabinete. Já nos momentos em que estava em casa, demandava frequentemente que seus assessores o abastecessem com documentos do mensalão.

Improviso
Há 22 anos no STF, o ministro Marco Aurélio Mello é um dos raros magistrados que abriu mão de usar o recesso para analisar o processo que irá julgar políticos influentes, como o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson.
Antepenúltimo ministro a votar no julgamento, Marco Aurélio afirma que pretende se manifestar de improviso diante dos colegas. "O mensalão, para mim, é um processo como qualquer outro. Vamos aguardar para ver o que o procurador-geral da República conseguiu demonstrar. A prova da culpa cabe ao Ministério Público, e não à defesa", observou.

Fabiano Costa / Do G1, em Brasília
Tags: Ministros,Supremo,trabalho,recesso,julgamento,mensalão,Brasil

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