quarta-feira, 27 de julho de 2011

Acidentes com motos encabeçam as ocorrências atendidas por bombeiros em MG

Estado de Minas



Hamilton Costa já quebrou braços, pernas e ombros, mas diz que não vai parar de dirigir moto (Jackson Romanelli/EM/D.A Press)

Hamilton Costa já quebrou braços, pernas e ombros, mas diz que não vai parar de dirigir moto
Identificados historicamente com o combate ao fogo, os bombeiros atenderam em 2010 mais casos de acidentes envolvendo motos que ocorrências de incêndio em Minas Gerais: foram 20 mil, contra 17 mil. Belo Horizonte, Uberlândia e Uberaba lideram o ranking de desastres. Na capital, a frota cresceu 76,5% nos últimos cinco anos, superando as 170 mil unidades em circulação, segundo o Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG). A expansão bate em muito o crescimento da frota de carros de passeio, que no mesmo período aumentou 41%.

Para a corporação, boa parte dos casos pode ser atribuída a desatenção e falta de manutenção dos veículos. O capitão Marcos Viana avalia que os cuidados adequados com o equipamento associado à direção defensiva ajudariam, e muito, a evitar colisões. “Há muito motociclista rodando com viseira aberta. Basta um cisco para ele perder o controle. Outros tantos não afivelam corretamente o capacete e, num acidente, o acessório voa para longe e não cumpre sua função. A pressão correta dos pneus também contribui”.

Ele acrescenta um componente ainda mais perigoso: o maus hábitos. “Muitos arrancam quando a sinalização para pedestre começa a piscar, num indicativo de que o sinal vai abrir para os veículos. Nesse momento, a outra via ainda está com sinal amarelo. E se um carro passar, acertará em cheio o motociclista. Acontece com frequência”, observa Viana. Ele apresenta dados que revelam a baixa preocupação com segurança: mais da metade das motos está com a luz indicativa traseira queimada, o que dificulta a visibilidade à noite.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Motociclistas e Ciclistas de Minas Gerais, Roberto Santos Lara, reforça a importância da educação e consciência no trânsito com um alerta para os condutores: “O para-choque da moto é a testa do motociclista”. Na avaliação de Lara, um dos pontos fundamentais para melhorar a forma de comportamento nas ruas é mudar o modelo de treinamento e condicionamento do motociclista ainda na autoescola. “Hoje, o acesso à moto está muito fácil. Com o dinheiro da passagem do ônibus paga-se uma prestação. E com os constantes atrasos e desconforto do transporte público, muita gente tem optado pela troca. Ela chega na autoescola e assiste a aulas teóricas. Em nenhum momento são informadas sobre os riscos envolvidos, estatísticas de acidentes e depoimento de quem já se machucou. Daí, a pessoa, que nunca usou uma moto, recebe aulas numa pista fechada, sem trânsito ou chuva. Sempre à luz do dia. É uma situação completamente irreal. É claro que chega às ruas despreparada”, aponta.

Inexperiência

Para Lara, o condutor ganha experiência no trânsito, o que muitas vezes pode ser fatal. Um cachorro cruzando a pista, uma porta se abrindo entre o vão dos carros são causas comuns de acidentes, sobretudo com pilotos inexperientes. De acordo com os bombeiros, mesmo entre os mais experimentados poucos sabem que quanto maior a velocidade, menor a aderência dos pneus. Essa é uma das maiores razões frequentes de desastres sobre duas rodas. “É muito comum, durante um socorro, ver a moto com os pneus carecas”, garante o capitão Viana.

O detalhe das luzes traseiras queimadas, como alertou o oficial, é outro agravante. E os números confirmam. As ocorrências atingem o pico entre as 18h e as 20h, envolvendo principalmente jovens de 18 a 26 anos. As motos estão em mais de 60% dos acidentes com vítimas. Por lei, o motociclista deve sempre transitar com o farol aceso, mesmo durante o dia. Jaqueta e luvas, embora não sejam obrigatórios, ajudam muito nos casos de queda. Os motoristas também podem fazer sua parte. Sempre sinalizando ao mudar de pista e conferindo nos retrovisores se não há motos se aproximando.

Viana aconselha aos motociclistas que vierem a se acidentar a ficar imóveis e aguardar o atendimento médico. Àqueles que testemunharem e forem ajudar, não devem tentar levantar o acidentado ou tirar seu capacete. “A primeira providência é sinalizar a pista. Em vias urbanas, com 50 metros de distância. Logo em seguida, ligar para os bombeiros e informar o local, tipo de ferimento e número de vítimas”.

Em 16 anos, 18 quedas

O ronco do motor, o vento na cara e a velocidade nas mãos são suficientes para encorajar o mecânico Hamilton Silva Costa, de 49 anos, a não largar o veículo sobre duas rodas. Motivo é o que não faltaria para ele desistir da ideia. Se contar nos dedos, eles não cabem nas duas mãos. Hamilton tem nada menos do que 18 razões para mudar de meio de transporte. Há 16 anos pilotando moto, ele já sofreu 18 acidentes, praticamente o equivalente a média superior a um por ano. Quebrou membros variados, como braço, ombro e perna. Mas nada disso o convenceu: “É a facilidade de ir de um lugar para o outro e paixão. Muita paixão”, confessa. Ele é um dos 3.888 motociclistas atendidos pela Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), de janeiro a 14 de julho.

Neste ano, por pouco, essa história de amor não chegou ao fim. Em maio, Hamilton sofreu o seu pior desastre, a mais séria das suas 18 quedas. Ele passava pela Região do Barreiro. “Quando entrei à esquerda da rua, um carro em alta velocidade tentou ultrapassar pela direita e bateu na minha traseira e na de outro motoqueiro. Fui lançado longe da minha moto e na hora perdi a consciência”, conta.

Hamilton acordou em meio aos equipamentos do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e descobriu que o motorista que causou o acidente não havia prestado socorro. “Mais tarde, soube que se tratava de um carro roubado, vindo de São Paulo”, lamenta. O mecânico sofreu fratura exposta na perna esquerda e ficou por 19 dias internado no Hospital Maria Amélia Lins, da Fhemig, onde teve que usar fixador externo, popularmente conhecido como gaiola, para afixar o osso da perna. “Voltei para casa e, depois de um tempo, tive uma infecção.”

Há oito dias, por causa do problema, Hamilton retornou para o hospital. Desta vez, teve que engessar a perna e não sabe quando receberá alta. Sentado na cama da unidade hospitalar, ele ri, ao ser perguntado se já não há motivos suficientes para largar a moto. “Não há. Assim que me recuperar, vou pilotar novamente”, revela, mas reconhece que é um risco alto ser motoqueiro em Belo Horizonte. “Sou responsável, o grande problema é que dirigimos para nós e para os outros”, afirma.

Na ala do andar de cima de Hamilton, no Hospital Maria Amélia Lins, outro paciente também não está convencido em largar a moto, mesmo depois de se acidentar. José Carlos Alves, de 53 anos, de Santa Luzia, na Grande BH, sofreu acidente no dia 16, quando passava por uma rua do Bairro São Bento, na Região Centro Sul. “A minha mão atrapalhou o acelerador, acabei acelerando e, como havia areia na via, derrapei”, conta. Ao cair, ele quebrou o ombro e a perna. Desde então, está à espera da cirurgia, para colocar placas nos membros. “Sou motoqueiro há 15 anos. Dependo do veículo para trabalhar. É um risco, mas vale a pena”.

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